Congresso Nacional

CCJ do Senado aprova marco temporal para demarcação de terras indígenas

A tese, já derrubada pelo STF, foi alvo de intensas críticas por governistas; foram apresentados dois relatórios paralelos ao do senador Marcos Rogério

Por Lucyenne Landim
Publicado em 27 de setembro de 2023 | 14:09

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, nesta quarta-feira (27), o marco temporal para demarcação de terras indígenas -tese já derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O placar foi de 16 x 10. O tema estava na pauta da última quarta-feira (20), mas um pedido de vista (mais tempo para análise do texto) adiou a votação em uma semana. Aprovado na CCJ, o projeto segue, agora, para votação no plenário do Senado.

O relatório do senador Marcos Rogério (PL-RO) reconhece como “terra indígena tradicionalmente ocupada” a área habitada, na data citada, pela comunidade originária em caráter permanente e utilizada para atividades produtivas.

Caso contrário, fica descaracterizada a ocupação permanente exigida em lei. A exceção será considerada em casos de “renitente esbulho” na data do marco temporal, ou seja, quando ficar registrado conflito pela posse da terra. Além disso, a proposição exige a comprovação de que as terras eram necessárias para a reprodução física e cultural dos indígenas e para a preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar.

O texto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em meio a um clima de tensão em maio deste ano, após 16 anos de análise no Congresso Nacional. No Senado, o tema recebeu o aval da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) em agosto. Caso também seja aprovado pela CCJ, ará por uma última votação no plenário do Senado antes de seguir para sanção presidencial. 

Foram apresentados dois relatórios paralelos. Um deles pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que defende, por exemplo, a judicialização de casos específicos. O parlamentar apontou que há risco de ampliar a insegurança jurídica. 

"Se centenas de terras já regularizadas, homologadas, demarcadas, declaradas ou sob estudo forem submetidas ao crivo do marco temporal, arão a ser novamente contestadas, com previsível aumento da violência fundiária e racista, ceifando vidas e eliminando culturas. Não é por outra razão que lideranças indígenas apelidam essa tese de 'genocídio legislado'”, argumentou.

Já o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES), defendeu, em seu parecer paralelo, a rejeição e o arquivamento da proposta. "Esse projeto não trata apenas do marco temporal. Esse projeto tem pontos extremamente sensíveis e fala em aculturamento da comunidade indígena", declarou.

"Não é argumento que o indígena tem carro ou usa o celular que ele está renunciando sua cultura ou sua tradição. Não é o fato de eu colocar um cocar na cabeça que me vai tornar indígena. Essa é uma visão simplista, imediatista e pragmática que quer vilipendiar uma comunidade indígena com quase cinco milhões de pessoas", acrescentou, destacando ainda risco na flexibilização do o a comunidades isoladas.

Apesar do debate no Legislativo, o STF derrubou a tese na última quinta-feira (21), com um placar de 9x2. Marcos Rogério rebateu os argumentos de que o debate no Senado desafia as competências do Judiciário e argumentou que não se trata de um debate entre governo e oposição. 

"Nós temos posições que podem até divergir, mas há uma compreensão de que esse é um tema do Brasil. Não é um tema de base ou oposição, é um tema de interesse nacional [...] que deve segurança jurídica e paz para indígenas e não indígenas", disse.

O resultado na Suprema Corte foi considerado uma conquista para as comunidades indígenas, mas é alvo de ataque por um grupo no Congresso Nacional, especialmente que faz oposição ao governo Lula. Os ministros vão definir, agora, as regras para demarcação de terras indígenas para garantir segurança jurídica.

Entre os pontos que serão analisados na sessão desta quarta está a possibilidade de indenização a particulares que adquiriram terras de “boa-fé” e se o pagamento seria condicionado à saída de proprietários das áreas indígenas. Nesse caso, a indenização por benfeitorias e pela terra nua valeria para proprietários que receberam dos governos federal e estadual títulos de terras que deveriam ser consideradas como áreas indígenas.

Também pode ser debatida a sugestão do ministro Dias Toffoli para autorizar a exploração econômica das terras pelos indígenas. Pela proposta, mediante aprovação do Congresso e dos indígenas, a produção da lavoura e de recursos minerais, como o potássio, poderiam ser comercializados pelas comunidades.