Ari de Oliveira Zenha é economista
O desenvolvimento das forças produtivas representa para o capital não só sua afirmação como sistema de produção dominante, mas também uma necessidade imperativa da sua dinâmica reprodutiva, no sentido do desenvolvimento e da apropriação contínua e ambígua da tecnociência. Isso não implica que o desenvolvimento técnico-científico que se realizou e se realiza esteja desvinculado das relações sociais, produtivas e históricas da humanidade.
No atual momento do capital, a tecnociência pode parecer ter uma autonomia, independência da estrutura produtiva dominante. Mas é uma constatação aparente, pois, na realidade, existe um imbricamento entre tecnociência e estrutura produtiva, em que ambas se interligam formando um todo que proporciona ao capitalismo uma alavanca para que suas estruturas continuem em desenvolvimento, mesmo que nos leve a uma situação de ime ou de barbárie autofágica.
Qual o papel da ciência?
O potencial destrutivo que o desenvolvimento da ciência e da tecnologia coloca para o mundo globalizado é uma realidade. Mas essa constatação sempre existiu em estado latente, seja qual for a forma que assuma o desenvolvimento tecnológico. Situar a análise desse desenvolvimento numa perspectiva a-histórica e moralista é extremamente questionável e polêmico.
O imperativo estrutural do dinamismo do capital sempre esteve alicerçado no desenvolvimento histórico/real das forças produtivas das potencialidades da ciência a serviço dessa dinâmica reprodutiva do capitalismo. A engenharia genética, a evolução da informática, da eletrônica, da robótica, da inteligência artificial, da biotecnologia, da nanotecnologia e outros avanços científico-tecnológicos no mundo nos colocam diante de importantes questões: a quem serve essa tecnologia? O que representam para a sociedade o desenvolvimento e a execução dessas novas tecnologias? Qual o papel da ciência no mundo do capital? Qual o sentido e significado para a humanidade do desenvolvimento tecnocientífico? Que controle tem a sociedade sobre esses processos?
Desaparecimento da espécie humana
Diante da hegemonia do capital globalizado, da predominância da sua autorreprodução ampliada, da busca pelo aumento da produtividade, da afirmação e expansão da ideologia dominante, da divisão social do trabalho, da subordinação do desenvolvimento tecnocientífico às necessidades e aos interesses do complexo militar-industrial, entre tantas outras, a tecnociência tem sido levada a dar legitimidade ideológica, produtiva e social ao desenvolvimento das forças produtivo-destrutivas do capitalismo.
Falar em desaparecimento da espécie humana, surgimento de nova espécie superior, uma mutação do ser humano, enfim, o aparecimento dos ciborgues, que seriam a corporificação dessas modificações bioquímicas, fisiológicas e eletrônicas que a tecnociência pode e vem arquitetando, é tratar de uma possibilidade real. O desenvolvimento da tecnociência, de fato, mantida dentro da lógica estrutural do capital, acarreta, devido à sua perversidade e destrutividade – que, não sendo contidas e sendo colocadas sob a hegemonia das forças sociais historicamente dominadas, exploradas e antagônicas do capital –, uma perspectiva extremamente perturbadora e também desintegradora para a humanidade.
Outra questão que podemos levantar é em relação aos aspectos jurídico-institucionais. Como todo avanço tecnocientífico, essas que nos apresentam no momento têm mostrado que as instituições jurídicas, criadas como parte da superestrutura do capital, estão completamente confusas e impotentes diante desses embaralhamentos de fronteiras e representações que a tecnociência coloca para toda a sociedade civil em nível global. Podemos constatar que as questões, dúvidas e certezas aqui apresentadas são extremamente complexas e merecem de todos nós profundas reflexões.