A morte de Jéssica Canedo, de 22 anos, que tirou a própria vida na sexta-feira (22) após a repercussão negativa de publicação mentirosa em páginas de fofoca de que ela tinha um relacionamento amoroso com o comediante Whindersson Nunes, reacendeu o debate sobre a responsabilização das mídias sociais.
Enquanto parlamentares e outros políticos de oposição lideram uma campanha de boicote à Choquei, a página que postou a informação falsa sobre Jéssica e Whindersson e é relacionada à esquerda brasileira, os governistas defendem a aprovação urgente do Projeto de Lei conhecido como “PL das Fake News”.
O projeto está parado na Câmara dos Deputados, com resistência dos oposicionistas e um forte lobby das grandes plataformas digitais, em especial as que controlam as redes sociais, como X (antigo Twitter) e o Facebook. Esses falam em cerceamento da liberdade de informação.
Por outro lado, os governistas, assim como muitos especialistas e integrantes do Judiciário, dizem que ou da hora de o Brasil seguir países europeus e pôr um freio nas redes sociais, devido justamente a casos como o de Jéssica e a disseminação de mentiras em todos os setores da sociedade.
Apesar do regime de urgência, projeto segue em banho maria
O texto original do PL das Fake News foi aprovado em 2020 no Senado. Em abril de 2023, a Câmara aprovou o regime de urgência. Apesar disso, o projeto está parado desde maio. Agora, com o caso Jéssica, seguido da invasão à conta da primeira-dama Janja da Silva no X, os governistas falam em prioridade.
Caso seja colocado em votação e aprovado pela maioria na Câmara sem alteração, ele segue direto para sanção presidencial. Se o texto original sofrer mudança, volta para análise dos senadores. Mas nada disso tem prazo. No domingo (24), o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do PL das fake news, pediu mais agilidade para a aprovação da proposta pelo Congresso Nacional.
Nas redes sociais, em meio à repercussão da morte da jovem Jéssica, o parlamentar afirmou que o debate sobre a regulação das grandes empresas de tecnologia é um dever “moral”.
“É preciso enfrentar esse estado de coisas, que remunera perfis e plataformas por mentiras que causam danos. As responsabilidades precisam ser apuradas e os autores, identificados e punidos. Não é um debate de esquerda ou de direita, é da civilização!”, escreveu Silva.
Corrente política defende regulação antes da campanha eleitoral
Na quinta-feira (21), antes da tragédia de Jéssica, o deputado federal José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, anunciou que o PL das Fake News será uma prioridade no cenário legislativo para o ano de 2024. Ele defendeu a regulação das mídias sociais antes do início da próxima campanha eleitoral.
“Se formos para um processo eleitoral sem mexer nisso, sem regulamentar isso, acontecerá a mesma coisa que nas eleições adas. Nós temos que unificar a Casa para votar”, afirmou Guimarães.
O PL das Fake News estagnou por causa de pontos que estão longe de um consenso. Um deles, se refere à remuneração de artistas e empresas de jornalismo por grandes empresas de tecnologia devido ao conteúdo produzido por essas pessoas e esses veículos, postados nas redes sociais, que faturam com audiência.
A medida para compensar os produtores de conteúdo foi acordada pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). No entanto, alguns setores se mobilizaram sob alegação que ela alimentaria uma desigualdade entre os grandes veículos e as mídias consideradas “alternativas”.
Há também um ime entre o setor artístico e empresas de radiodifusão. Enquanto os artistas defendem um órgão responsável pela arrecadação e distribuição de direitos autorais para o setor audiovisual – como o Ecad – para a música, representantes das empresas de rádio e TV argumentam que qualquer mudança nesse sentido deveria ser debatida para situações futuras, considerando que os contratos existentes já contemplam cláusulas de direitos autorais.
Texto exige maior moderação, para evitar casos como o de Jéssica
Mas o projeto das Fake News não se restringe aos universos da política e do jornalismo. Ele cria normas também sobre conteúdos destinados a crianças e adolescentes. O texto exige das plataformas a publicação de relatórios semestrais de transparência, com informações sobre a moderação de conteúdo falso.
A nova lei, se aprovada, alcançará plataformas com mais de 10 milhões de usuários em 12 meses, incluindo empresas sediadas no exterior. Elas terão que informar imediatamente às autoridades qualquer informação que levante suspeitas de que ocorreu ou que possa ocorrer um crime que envolva ameaça à vida.
O PL estabelece prisão de um a três anos e multa a quem promover ou financiar a disseminação em massa de mensagens que contenham “fato que se sabe inverídico” e que possa comprometer a “higidez” do processo eleitoral ou causar dano à integridade física de agentes públicos.