BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva elogiou nesta quarta-feira (8) o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, e os comandantes das Forças Armadas, durante discurso em evento que marcou os dois anos dos atos de 8 de janeiro de 2023.
“Quero agradecer o ‘Zé Múcio’, que trouxe os três comandantes das Forças Armadas para mostrar a esse país que é possível a gente construir as Forças Armadas com o propósito de defender a soberania nacional”, ressaltou Lula.
Militares são acusados de participar de um trama golpista para impedir a posse de Lula e até matá-lo. O plano incluiria ainda os assassinatos do vice, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A PF concluiu que apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) participaram dos atos de 8 de janeiro para derrubar o recém-empossado Lula e colocar de volta no Palácio do Planalto o ex-presidente, por meio de um golpe que incluiria as Forças Armadas.
Generais ocuparam cargos estratégicos no governo de Bolsonaro, que é capitão da reserva do Exército. O general Braga Netto, que foi ministro e vice na chapa de Bolsonaro em 2024, está preso desde 14 de dezembro, acusado de liderar plano de golpe de Estado.
‘Ainda estamos aqui’, ressalta Lula
Em outro momento do seu discurso desta quarta-feira, Lula defendeu a democracia com referência direta ao filme "Ainda estou aqui", que mostra os efeitos da ditadura militar na vida da família do ex-deputado Rubens Paiva, desaparecido após ser levado de casa por agentes do regime.
“Hoje é dia de dizermos em alto e bom som: ainda estamos aqui. Estamos aqui para dizer que estamos vivos e que a democracia está viva, ao contrário do que planejaram os golpistas de 8 de janeiro de 2023”, afirmou o presidente.
“Hoje estamos aqui para que ninguém seja morto ou desaparecido em razão da causa que defende. Estamos aqui em nome de todas as Marias, Clarices e Eunices”, continuou, em citação a Eunice Paiva, esposa de Rubens, retratada em "Ainda estou aqui". “Hoje é dia de dizermos em alto e bom som: ditadura nunca mais, democracia sempre”, completou.
‘Ninguém vai parar de te chamar de Xandão’, diz Lula a Moraes
No início do discurso desta quarta-feira, de forma improvisada, Lula chamou Alexandre de Moraes de Xandão. “Tenho 79 anos, já vivi muito vendo a Suprema Corte brasileira, e nunca conheci um ministro da Suprema Corte que tivesse um apelido, apelidado dado pelo povo, chamado Xandão".
"É um apelido que já pegou. E desse apelido você nunca mais vai se libertar. Pode ficar sério, e não adianta ficar nervoso, que ninguém vai parar de te chamar de Xandão”, afirmou Lula ao microfone, olhando para o ministro do STF, em meio a um palácio lotado de autoridades dos Três Poderes. Muitos aplaudiram e riram, como Moraes.
O presidente voltar a citar “Xandão” ao lembrar lembrou do plano, revelado pela Polícia Federal (PF), que envolvia o assassinato dele, de Moraes e de Alckmin, após as eleições de 2022.
“Escapei da tentativa junto com o Xandão e companheiro Alckmin de um atentado de um bando de irresponsáveis, aloprados, que acharam que eu não precisava assumir a Presidência depois do resultado eleitoral e que seria fácil tomar o poder”, afirmou Lula. “Falei para o Alckmin: acho que Deus é muito inteligente e ele achou que a gente daria mais trabalho aqui”, completou.
Lula também falou do acidente que teve no Palácio da Alvorada, quando bateu a cabeça e, depois, ou por cirurgias. “Achei que tinha chegado o meu fim, não chegou o meu fim. Estava tão otimista, estava pensando até em tomar um gole, estava sem beber até então”.
“Cheguei em São Paulo, os médicos estavam horrorizados, porque eu podia ter morrido na viagem ou entrado em coma, o avião democraticamente levou 4h pra chegar. Agora estou com a cabeça limpa e purificada”, brincou.
STF já condenou 371 pessoas
O STF já condenou 371 pessoas por incitação e participação nos atos de 8 de janeiro. Outros quatro réus foram julgados e absolvidos. O episódio de dois anos atrás deixou um prejuízo material ao país de mais de R$ 26 milhões – R$ 11 milhões só no Supremo.
Dos 1.552 processos instaurados na Corte contra os envolvidos, 527 se transformaram em acordos de não persecução penal feitos pela Procuradoria-Geral da República (PGR) com acusados.
Esse acerto é uma alternativa ao processo judicial tradicional para crimes que não envolvam violência ou grave ameaça e que tenham pena mínima inferior a quatro anos. O objetivo é evitar o encarceramento e aplicar a prisão apenas em casos de risco social efetivo.
O número de acordos – que precisam ser validados pelo STF – chegou a ser avaliado pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, como baixo.
Do total de crimes apurados, 1.093 são simples – como incitação ao crime por pedir a derrubada do governo e associação criminosa – e 459 são graves – como tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, associação criminosa armada, dano qualificado e deterioração do patrimônio.
Ao todo, 78 processados estão em prisão provisória, 70 presos definitivamente e sete em prisão domiciliar.
Dezenas de condenados estão foragidos. Segundo levantamento da PF, ao menos 60 estão em locais desconhecidos. Muitos deles escaparam enquanto aguardavam em liberdade recursos contra as condenações do STF.
Uma parte dos fugitivos se mudou para países da América Latina, como Bolívia, Peru e Argentina. Neste último caso, a polícia local chegou a decretar a prisão desses foragidos, mas só quatro foram detidos até agora.