A poucos dias de assumir a presidência do Superior Tribunal Militar (STM), um dos órgãos máximos do Poder Judiciário brasileiro, a ministra mineira Maria Elizabeth Rocha conversou com O TEMPO sobre os desafios adicionais que enfrentou em sua trajetória por ser mulher. Além de ser a primeira presidente eleita no STM, a ministra também foi a primeira a ocupar o cargo de forma interina, liderando o tribunal por nove meses, de 16 de junho de 2014 a 15 de março de 2015, após a aposentadoria compulsória do então presidente Raymundo Nonato de Cerqueira Filho. Ela também é a única mulher a integrar o tribunal em todos os seus 217 anos de história. 

“Eu brinco que muita sufragista morreu para que hoje eu pudesse me sentar numa cadeira dessas”, disse a ministra, acrescentando: “felizmente, eu não fui ameaçada de morte em momento algum, e acho que nem corro esse risco. Mas as minhas lutas e as violências que eu sofro hoje são simbólicas”, afirmou Elizabeth. Sufragistas foram mulheres ativistas que lutaram pelo direito ao voto feminino. O movimento começou na Inglaterra no final do século 19 e se espalhou pelo mundo ao longo do século 20.

A entrevista exclusiva da ministra será veiculada na íntegra no programa Café com Política de segunda-feira (10), às 9h, no canal de O TEMPO no Youtube. Elizabeth afirmou também que espera poder contribuir para a construção de uma sociedade mais igualitária e mais justa. “E que aqueles que virão depois de mim, as mulheres mais jovens, possam usufruir dessas lutas. Não digo que elas não enfrentarão outras lutas, enfrentarão, com certeza, mas que não sejam as mesmas que eu enfrento, porque não faz sentido. A sociedade tem que evoluir e nunca retroceder”, opinou. 

Disputa acirrada

Para a ministra, a eleição acirrada que enfrentou em dezembro do ano ado – por oito votos a sete - reflete o cenário em que as mulheres precisam lutar ainda mais para conquistar seus espaços. “A minha eleição comprovou isso, porque eu fui eleita por um voto de diferença - o meu voto - e eu sendo a mais antiga dentre os civis”, pontuou. 

Elizabeth também falou sobre o preconceito que as mulheres enfrentam. “Não vou negar, foi difícil, eu sou a primeira e a única mulher na Corte mais antiga de Justiça do Brasil, criada em 1808 por Dom João, quando ele ainda era príncipe regente. Então, veja bem, é uma corte bicentenária e realmente nós, mulheres, temos que quebrar ainda tetos de vidro. E eu brinco, não são apenas tetos de vidros que nós quebramos. Nós quebramos paredes, nós quebramos a casa inteira, porque ainda existe um determinado preconceito dentro da sociedade”.  

Na avaliação da ministra, “o estado ainda é patriarcal e misógino”. “Para que nós possamos ocupar os nossos espaços e buscarmos a igualação, que está formalmente garantida na Constituição, mas que materialmente ainda não se perfez na sua integralidade, é preciso muita luta”. 

‘Não quero ser comparada a um homem’

A futura presidente do STM também avaliou que ainda luta pelo reconhecimento. “Eu lutei e continuo lutando, até porque eu não me rendo à homogeneidade. Eu não quero ser comparada a um homem dentro da Corte, eu quero ser uma pessoa distinta, que eu sou, a única do meu gênero. E falo não apenas pelas mulheres, mas também pelas minorias, que não têm espaços de ocupação de poder reservados. Então, é preciso que nós, mulheres, realmente tenhamos essa consciência”, afirmou. 

A ministra se declara feminista e diz que é necessário falar sobre os obstáculos enfrentados pelas mulheres. “Eu não vou dizer que foi fácil, porque eu acho que até a minha própria postura feminista me obriga a falar das dificuldades que nós mulheres enfrentamos, mas também, por um lado, eu tenho esperança de abrir caminhos para pessoas mais jovens".