De sua cadeira na plateia, o jovem estudante paulistano se sente próximo de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Alceu Valença. De fato, a distância entre o assento e o palco é pequena, mas o que aproxima Paulo Miklos, 60, dos ídolos de sua infância é o fato de essas apresentações terem sido feitas apenas com voz e violão, em lembranças que surgem misturadas na memória do ex-vocalista do Titãs. “São shows maravilhosos, íntimos, que não têm aquela pirotecnia toda da banda”, diferencia Miklos.
É com esse formato que ele abre nesta sexta (14) a quarta edição do projeto “Uma Voz, um Instrumento”. “A experiência de você se acompanhar ao violão promove uma dinâmica mais orgânica, que te dá a possibilidade de outro tipo de respiração”, explica. “No meu caso, o violão expõe a essência do intérprete. É um pouco como mostrar a fonte, o nascedouro daquelas canções. Os arranjos originais são feitos no violão, e as pessoas vão poder reconhecer isso”, garante.
Outra oportunidade única que o músico não vai deixar escapar é a de contar a história por trás das canções, o que o leva, novamente, a se colocar no lugar do outro. “Acho divertido, como fã, entender de onde veio cada música”. Habituado a compor tanto a letra quanto a melodia, Miklos conta que, para ele, “a inspiração vem das coisas mais simples da vida”. “As alegrias e tristezas cotidianas, uma grande paixão ou uma notícia de jornal”.
Porém, o músico não esconde sua insatisfação com as últimas notícias que vêm chegando até ele por meio da mídia. “Vivemos um momento complicado no país. Eu já tinha a opinião de que o golpe contra a (ex-presidente) Dilma (Rousseff) representava uma ruptura delicada da democracia, e estamos vendo os desdobramentos disso, com o objetivo claro de tomar o que é do povo brasileiro, a partir das reformas neoliberais da ultradireita”, opina.
Repertório. No show, Miklos pretende priorizar as músicas de seu mais recente álbum, “A Gente Mora no Agora”, lançado em 2017. Apesar disso, ele não descarta seguir o calor do momento, e aponta “a chance de ficar mais solto” como uma das vantagens em estar sozinho no palco. Ele pode até, eventualmente, atender aos pedidos dos fãs. “Se o pessoal estiver cantando junto, a gente toca mais hits”.
Exatamente por isso, o músico se preparou para entrelaçar sucessos de sua trajetória com obras da última lavra, recheada de parcerias com Emicida, Erasmo Carlos, Russo apusso, Céu, Guilherme Arantes, Arnaldo Antunes e Tim Bernardes. “Muita gente me pergunta sobre a continuidade das novas gerações no rock, e esse trabalho dá uma resposta, ele é um exercício de encontro entre os vários estilos e gerações, é uma coisa viva. O que eu quis deixar bem claro foi que a diversidade me representa, essa é a minha identidade”, assegura.
No disco, Miklos ainda recebeu de presente uma música de outro antigo companheiro de Titãs. Nando Reis compôs para ele a romântica “Vou Te Encontrar”. Os versos falam sobre a transcendência do amor. Em 2013, Rachel Salém, esposa de Miklos, faleceu vítima de câncer. “É uma riqueza enorme a gente conseguir se aproximar da dor dos outros”, afirma.
Nesse sentido, ele também vai se colocar no papel de intérprete de canções alheias. Do rapper Sabotage (1973-2003), com quem contracenou no filme “O Invasor” (2002), o cantor selecionou “O Bom Lugar”. De outra atuação nas telonas, surgiu o segundo tributo da noite. Em 2015, Miklos deu vida a Adoniran Barbosa (1910-1982) no curta-metragem “Dá Licença de Contar”, dirigido por Pedro Soffer. “Vou cantar ‘Saudosa Maloca’, que é um clássico eterno”, revela.
Aliás, o compositor não para de investir em sua veia de ator. Ele aguarda o lançamento de dois longas-metragens em que atuou: “Clube dos Anjos”, de Ângelo Defanti, inspirado em livro de Luis Fernando Verissimo, e “O Homem Cordial”, de Iberê Camargo, onde ele vive o protagonista, um roqueiro dos anos 80. “Não é irônico?”, brinca. Em julho, o cantor começa a gravar “Jesus Kid”, baseado nos quadrinhos de Lourenço Mutarelli.
Serviço. Show de Paulo Miklos, nesta sexta (14), às 21h, no Centro Cultural Minas Tênis Clube (rua da Bahia, 2.244, Lourdes). De R$ 25 (meia-entrada) a R$ 50 (inteira).
Ouça música do último disco de Paulo Miklos: