CANOAS (RS). Um choro intenso, de surpresa e desalento. As mãos nos olhos para conter a emoção por trás das lentes dos óculos. Mas um choro rápido, de quem parece estar, de forma inconsciente, com a ideia de que precisa se manter forte. Foi assim que reagiu Juraci Oliveira, de 65 anos, ao lembrar do Dia das Mães, celebrado neste domingo (12). Em meio à tentativa de sobreviver às enchentes na cidade de Canoas, no Rio Grande do Sul, não há sequer disposição para pensar na vida.  

Ela está em um abrigo após ter tido sua casa, no bairro Fátima, alagada. Dos sete filhos, tem a companhia de um (os outros, também afetados pelas enchentes, estão em outros alojamentos improvisados), além de netas, na Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). O ponto é um dos “QGs” montados na região metropolitana de Porto Alegre.  

“É... Dia das Mães, né. Tem mães que perderam o filho. Quantos morreram na água, né? Eu penso que quem tem família tem que agradecer a Deus, porque nós íamos morrer todos na água”, disse. “No ano ado eu estava com meus filhos perto de mim. E nesse ano está um aqui, o outro lá. Mas estamos todos vivos. Eu creio que eles vão me mandar um áudio me desejando feliz Dia das Mães”, disse Juraci. 

O sentimento de alívio, demonstrado por Juraci, é o principal compartilhado por mães que precisam enfrentar, dessa vez, uma realidade não esperada. Mas a angústia também tem lugar e aparece estampada no rosto. Lúcia Amaral, de 70 anos, está no abrigo junto ao marido e a um de seus dois filhos. Ela perdeu tudo no bairro Fátima, que está praticamente submerso.  

“Não é [como eu queria ar o dia]. Eu queria ar com meus filhos em casa. Eles sempre fazem as festinhas de Dia das Mães na minha casa. Eles iam para lá, faziam o almocinho deles. A gente ava feliz ali. Esse ano amos aqui, né”, contou emocionada, sem nem tentar disfarçar os olhos marejados.  

“Graças a Deus eu estou com a minha filha. Muitas famílias aqui foram salvas. O sentimento de gratidão vai ser maior do que a tristeza”, relatou Dione Alves, de 53 anos, moradora do Rio Branco. Ao narrar sobre o momento assustador de resgate da casa em que estava quando a água começou a subir já para o segundo andar, ela não consegue esquecer da preocupação de sua filha, de 23 anos, em apenas mantê-las vivas em um cenário de tragédia sem precedente. 

Primeiro Dia das Mães  1e42g

Também não era dessa forma que as primas Clara Vaz, de 19 anos, e Tainá Rosa, de 22, esperavam ar o primeiro Dia das Mães delas. “Eu queria estar na minha casa, me arrumando para sair com ela. A gente ia tirar umas fotos de mãe e filha do meu primeiro Dia das Mães para guardar. Não vai ser possível. A gente já tinha marcado para ir com uma fotógrafa em um lugar bem legal, com árvore. Não vai ser possível”, disse Tainá.

A jovem é mãe de Laís, de apenas dois meses. Com tão pouca idade, a bebê pode estar ando, sem ter consciência disso, pela situação mais desesperadora de sua vida. Tainá, por outro lado, jamais esquecerá. 

“É um sentimento de tristeza e alegria ao mesmo tempo. Alegria porque eu estou com a minha filha em meus braços. Mas eu queria que fosse outra situação, porque ser mãe é uma coisa que a gente cria um amor tão grande que a gente quer que seja tudo perfeito, tudo maravilhoso”, disse. 

Clara, que ou a data no ano ado grávida de Maria Cecília, de quatro meses, também divide o sentimento de alívio e felicidade por estarem, as duas, bem fisicamente. “Porque pela situação que a gente estava, a gente não sabia nem se ia ser resgatado, nem se a gente ia conseguir sair com ela nos braços”, relatou. 

O resgate dela foi de barco, por cima do telhado de uma casa vizinha, com a água que invadiu o local já molhando quem tentava resistir. “No sábado a gente sempre almoça juntas, todas as mães da família. E no domingo a gente sempre almoça na casa da minha mãe”, lembrou sobre como costuma ser a comemoração quando a vida corre na normalidade que deve ser.